Em decisão unânime, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça negou provimento a Recurso Especial que buscava invalidar a doação de imóvel feita por um pai, já morto, apenas aos filhos do primeiro casamento e em acordo de separação homologado judicialmente.
Em seu voto, a ministra Nancy Andrighi, relatora, explicou que, na situação julgada, podiam ser doados para os dois descendentes até aproximadamente 83,3% do patrimônio total — 50% da parte disponível, acrescidos das correspondentes frações da legítima — parte da herança reservada legalmente aos herdeiros necessários —, que equivaliam a 33,2%.
“Como a doação não atingiu 57% do patrimônio existente à época, doação inoficiosa não houve, cabendo, agora, apenas trazer o bem doado à colação, para fins de equilibrar ou igualar a legítima”, disse a relatora.
“O instituto da colação irá, por primeiro, assegurar que os não contemplados com a doação possam, ainda assim, ter resguardado o seu quinhão na legítima, mesmo que seja por redução na doação e, de outra banda, garantir que a vontade do doador seja respeitada no limite da possibilidade legal”, concluiu a ministra.
Processo
Durante o processo de inventário do pai, uma liminar declarou a nulidade da doação feita a dois filhos do primeiro casamento, por considerar que ela violou os direitos dos herdeiros necessários, já que um terceiro filho, fruto de outra relação, não foi contemplado.
A decisão, entretanto, foi reformada no Agravo de Instrumento interposto pelos dois filhos beneficiados, que conseguiram o reconhecimento da legalidade do ato.
A discussão chegou ao STJ em Recurso Especial, no qual, além da inoficiosidade da doação, também foi questionada sua validade, já que foi homologada apenas em juízo, sem a transferência de propriedade por escritura pública.
A relatora considerou todo o procedimento válido. Disse que já é “posicionamento cristalizado” na 3ª Turma que a existência de sentença homologatória de acordo, em separação judicial, pela qual o antigo casal doa imóvel aos filhos, tem idêntica eficácia da escritura pública.
A ministra observou ainda que o caso não trata de “promessa de doação, fórmula repelida pelo ordenamento jurídico, porquanto o que não existiu foi a formalização cartorial do ato, que pode ser suprida, quando a doação estiver inserida em acordo de separação judicial”.
Em relação à doação inoficiosa, por ter sido o terceiro filho preterido, a ministra disse que o Direito brasileiro admite a possibilidade de os pais privilegiarem filhos em detrimento de outros, desde que seja preservada a legítima.
A advogada Maria Stella Torres Costa, sócia do escritório Dias Munhoz Advogados, especializada em família e sucessões, considera o entendimento do STJ correto. “De fato, a transferência de bens para qualquer dos filhos através de doação em vida não fere o direito hereditário daqueles que foram preteridos, se por ocasião do inventário e partilha o quinhão conferido a cada herdeiro necessário respeitar o percentual legal”, comenta.
Ela diz que a soma dos bens que restarem no acervo a ser partilhado deve ser suficiente para fazer frente à legítima. “Pode, portanto, o autor da herança dispor livremente de tudo o que exceder o percentual legal referente à legítima, o que será apurado em colação”, aconselha.
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